Coragem, imaginação e empenho político são os elementos decisivos para garantir o futuro do Parque Oriental do Porto. Temo-los encontrado em projectos de interesse bem duvidoso e noutros de importância indiscutível. Em praticamente todos os casos aqueles factores criaram as condições para que as dificuldades fossem ultrapassadas e os projectos se tornassem realidade.
Mas precisamente por que a necessidade e relevância de um Parque Oriental para a cidade e região reúne já um amplo consenso público, inclusivamente do executivo liderado pelo Dr. Rui Rio, mais se justificam a coragem, imaginação e empenho para resolver as adversidades.
Referimo-nos, concretamente, à necessidade de reformular a rede viária proposta para o Vale de Campanhã, que na sua concepção inicial surge absolutamente desajustada face às intenções de criar uma ampla zona vede na zona oriental da cidade. Este conjunto de vias é alvo de um protocolo entre a Câmara Municipal do Porto (CMP) e o Instituto de Estradas de Portugal (IEP).
A Campo Aberto apela à CMP, seu Presidente, Vereador do Urbanismo e Vereador do Ambiente, para que respeitem e aproveitem esta oportunidade para cumprir as suas propostas eleitorais, provando que há outras formas de fazer cidade, exequíveis, com benefícios para todos e capazes de transformar uma zona deprimida como o Vale de Campanhã num lugar aprazível.
O que seria de todo incompreensível era levar por diante uma proposta que teria sérias repercussões a longo prazo para a cidade e em particular para a viabilidade do Parque Oriental e que, quase unanimemente, foi considerada como de má qualidade, sob o pretexto de respeitar um acordo com o IEP. Acresce que, se esse acordo é reversível, já o erro dele resultante será irreversível, pelo que o momento para agir é o actual.
A solução está à vista. Impõe-se, agora, a reformulação da rede viária proposta para o Vale de Campanhã e a concretização do Parque Oriental e do Agroparque.
Propostas da Campo Aberto para o Parque Oriental
A zona oriental da cidade do Porto é regularmente referida por políticos e cidadãos como uma zona degrada, marginalizada, onde se concentram diversos problemas que carecem de resolução. Efectivamente constatamos que, pelo menos em parte devido ao reduzido investimento público que a área tem recebido e à sua errada orientação, se trata de uma um território algo inóspito, socialmente deprimido, de difícil acesso, claramente suburbano e sem pontos de referência, apesar de nele subsistirem fortes marcas de ruralidade.
Este é o cenário actual do Vale de Campanhã, e é o cenário com o qual os decisores de hoje têm de lidar. O PDM deverá, pois, procurar corrigir esta situação. Os 10 anos de vigência do Plano são, em princípio, suficientes para o assegurar, desde que o rumo seguido seja bem pensado e estruturado.
Uma visão para a zona oriental do Porto
Qual o futuro da zona oriental do Porto? É esta a pergunta a que planeadores e cidadãos deverão, antes de mais, responder. Afinal, o que se pretende para todo aquele espaço? Como corrigir os problemas que actualmente enfrenta? Como o reabilitar social, urbanística e paisagisticamente? Como o tornar urbano e convidativo para as pessoas? Considerando o carácter fortemente rural desta zona da cidade, há antes de mais que pensar até que ponto se justifica ampliar a já extensa malha urbana do Porto. Mesmo numa óptica regional, admitindo que a cidade há muito extravasou os seus limites administrativos – em boa parte devido ao caos urbanístico que grassa em todo o país –, há que reflectir sobre se o rumo que se pretende é o de ocupar de forma sistemática todos os terrenos livres ou se, pelo contrário, é o de preservar e estimular a existência de várias bolsas de dimensão média e elevada para garantir a subsistência e vitalidade dos vários sistemas naturais. A estes espaços devem-se acrescentar as zonas agrícolas, cuja função, apesar de renegada, é de primordial importância para o abastecimento alimentar de proximidade (e, logo, com menores impactos ambientais associados). Pensamos que o futuro da zona oriental da cidade deve residir, fundamentalmente, em potenciar o uso agrícola do solo que ainda é cultivado, o carácter rural da malha urbana com essas características (núcleo de Azevedo) e o normal funcionamento dos sistemas naturais, com particular destaque para a relação dos rios Tinto e Torto com os seus vales e com o Douro, estimulando sempre a fruição pública e o contacto dos cidadãos com a natureza.
Nenhuma outra zona da cidade tem este potencial. De facto, trata-se de um potencial único no Porto e de enorme valor, sobretudo se atentarmos à dimensão do espaço em causa e às características já referidas.
O problema da rede viária proposta
A rede viária proposta – continuação da Alameda de Cartes, Colectora de Azevedo e ligação da primeira à Circunvalação (que, estranhamente, não consta das cartas do PDM proposto) – terá um efeito esmagador sobre o Vale de Campanhã, esventrando-o irremediavelmente. As novas estradas, com perfil semelhante a auto-estrada (2 faixas para cada sentido separadas por um corredor central), servirão para definir em boa parte os limites das áreas verdes (sobretudo do Parque Oriental) e criar novas zonas de construção. Naturalmente, esta área de expansão urbana é conseguida à custa de terrenos que deveriam integrar os parques.
Acresce que, devido à orografia do terreno, as referidas vias obrigarão a taludes de grande dimensão (alguns com 10 metros de altura!), o que contrasta de forma flagrante com o carácter natural ou urbano que se pretende para o Vale.
Por tudo isto, se a proposta for avante, algumas zonas do Parque Oriental tornar-se-ão uma espécie de “enclaves”, cercadas por estradas de grande dimensão e totalmente inóspitas para o cidadão. Algumas zonas do Parque ficarão com pouco mais de 50 metros de largura, o que, aliado ao relevo do Vale e aos taludes da Circunvalação e da Colectora de Azevedo, criará no cidadão a sensação de estar aprisionado, esmagado pela envolvente terrífica que se antevê. Apesar de todas as críticas que fazemos à rede viária pensada para o Vale de Campanhã, parece-nos importante contrariar o isolamento do Bairro do Lagarteiro e do lugar de Azevedo, que está provavelmente na origem de alguns dos problemas sociais existentes. Relativamente às vias já existentes, como a Circunvalação e o IC29, há que implementar medidas com vista à redução do impacto que têm sobre o Vale de Campanhã. A arborização dos taludes e zonas envolventes teria seguramente um efeito bastante positivo.
Criar pontos de referência e de qualidade no Vale de Campanhã
Parece-nos acertado acautelar algumas áreas de equipamento para o Vale de Campanhã, apesar de serem eventualmente excessivas. Espera-se que as estruturas a construir possam cativar a visita de habitantes oriundos de outras zonas da cidade ou mesmo de fora dela. Por que não, por exemplo, instalar um eco museu sobre a actividade agrícola e as práticas tradicionais, incluindo um viveiro com as espécies utilizadas, sua biologia e venda de sementes? Ou de uma biblioteca? Alertamos contudo para a necessidade de se evitarem volumetrias desajustadas que possam ser agressivas para a paisagem, bem como para o cuidado a pôr na arborização das áreas envolventes. Queremos jardins e parques bem pensados e com qualidade, algo que de nos possamos orgulhar no futuro.
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