Comunicado
à imprensa
25 de Fevereiro
de 2004
Rotunda
e Av. da Boavista devem ser amplamente discutidos
O
absurdo: jardim temporariamente “desclassificado” para a passagem de
automóveis!
A Campo Aberto regista com agrado
as declarações do Vereador do Urbanismo, Arq. Ricardo Figueiredo, publicadas no
JN de Sábado, referindo‑se ao projecto de renovação da Rotunda da
Boavista, onde revela a sua mudança de opinião precisamente no sentido que apontámos
recentemente em comunicado: o auditório e restaurante inicialmente previstos
foram eliminados, mantendo-se apenas a casa de chá e o quiosque – equipamentos
que terão, respeitadas algumas condicionantes, um impacto bastante positivo no
jardim.
Esta intervenção na Rotunda, contudo,
nunca foi suficientemente explicada à cidade nem publicamente debatida. Defendemos
por isso que, para que sejam promovidos os valores da cidadania e da
transparência, e para que não se caia sistematicamente numa gestão autocrática
do município, se proceda a um amplo debate público, há muito devido, sobre o
futuro da Rotunda e da Avenida da Boavista e a sua relação com o metro. Tratando-se
de uma área tão sensível e relevante da cidade, os cidadãos e forças vivas da
cidade devem ser chamados a pronunciar-se e a participar activamente na sua
definição.
Jardim histórico
convertido num banal arruamento da cidade, com sinais de trânsito e tudo!
Infelizmente, nem tudo são boas
notícias. Nos espaços verdes do Porto, castigados nos últimos anos por
descaracterizações e maus-tratos, o absurdo continua a acontecer, como agora
com o abrupto regresso dos automóveis ao jardim da Rotunda da Boavista. Não
fossem as máquinas pesadas e o alcatrão bem negro, poderíamos mesmo assegurar
que se tratava de um engano. As obras avançaram em tempo record, sem
qualquer aviso prévio, de modo a permitir o desvio temporário do trânsito
enquanto decorrerem as obras no anel exterior. Mas, mesmo como solução
temporária, estamos perante uma opção fortemente condenável.
Só uma visão arcaica e prepotente
faz dos jardins da cidade espaços violáveis por dá‑cá‑aquela‑palha,
inclusive sujeitando-os à fragmentação, ainda que temporária, pelo
atravessamento automóvel. Mutilações ou agressões dessas são ainda mais
inaceitáveis em espaços de grande valor histórico, patrimonial e simbólico,
como é o caso do jardim da Rotunda. Ainda que temporária, esta intervenção nem
por isso deixa de interferir muito negativamente com ele. Seis árvores foram já
removidas e transplantadas, operação de resultados sempre incertos. Uma foi
abatida, diz-se que por estar em mau estado fitossanitário. Admitindo que isso
seja verdade, é tempo de acabar de vez com a prática de só descobrir problemas
fitossanitários nas árvores quando se pretende justificar o seu abate por
motivo de obras que nada têm a ver com os interesses dessas árvores. É tempo de
separar claramente os necessários cuidados fitossanitários de intervenções
casuísticas que deixam sempre a possibilidade de uma suspeita.
Acresce que a compactação muito
elevada do solo e a sua impermeabilização resultantes da intervenção são altamente
perniciosas para as árvores. Por essa razão, o projecto de renovação da Rotunda
deve prever a remoção completa de todos os tapetes de asfalto do jardim,
antigos e recentes, recorrendo a soluções de pavimentação permeáveis e apenas
onde estritamente necessário.
Existiam
alternativas viáveis
Por temporária que seja, a actual
solução repete em parte o erro de concepção de tráfego cometido naquele mesmo
jardim em 1954 aquando da abertura dos arruamentos asfaltados ali existentes e
agora retomados. A não ser que sejam tomadas medidas excepcionais de precaução,
condicionamento e disciplinação do trânsito, são de prever acidentes como
aqueles que forçaram, em meados dos anos 1950, o rápido encerramento ao tráfego
das vias abertas no interior do jardim.
Existiam alternativas que teriam
a dupla vantagem de poupar o jardim, mantendo-o em usufruto pelos cidadãos, e
de evitar previsíveis acidentes e a insegurança para as pessoas deles
decorrentes, assumindo que é necessário cortar ao trânsito simultaneamente todas
as faixas de rodagem. Para a grande parte do trânsito, que é de atravessamento,
teriam sido possíveis desvios por percursos alternativos, via ruas Oliveira
Monteiro, Campo Alegre e Pedro Hispano. O trânsito de proximidade poderia ter
sido desviado para ruas secundárias, com eventual eliminação de estacionamento
para aumentar o fluxo do tráfego (por exemplo, para o trânsito afluente da Rua
5 de Outubro, usar-se-ia alternativamente as ruas dos Vanzeleres, Fernandes
Costa e João de Deus, até se atingir a Av. da Boavista). Com alguma imaginação
e estudo específico seguramente seria possível evitar a má solução pela qual se
optou.
Conclusão
Sobre o jardim da Boavista, o
actual executivo municipal, de há um ano para cá, muda constantemente de
opinião e de intenções, sem nunca explicar à cidade com clareza os motivos das
decisões e contradecisões. Quem, como o presidente da CMP, se orgulha
publicamente de ter rompido com a forma como a cidade vinha sendo gerida pelos
executivos anteriores, neste domínio corre antes o risco da continuidade no
erro. Como se pode aceitar que a agressão ao jardim da Rotunda seja consentida
pela mesma Câmara que tanto se bateu, e bem, pela defesa do Parque da Cidade?
Tal como o anterior, também este executivo parece disposto a consentir, nas obras
relacionadas com o Metro, o assalto desenfreado a jardins e espaços para peões,
em contraste com a obsessão de não tocar, mesmo temporariamente, no espaço
reservado à circulação automóvel.
Em matéria de respeito pela
dignidade do espaço público, da árvore e do espaço ajardinado, o actual
executivo ainda não deu provas do espírito de ruptura com o passado de que
tanto se reclama. Oxalá tenha a humildade de arrepiar caminho.
Para mais informações:
Nuno Quental: 93 375 39 10
Paulo Araújo: 93 363 10 09
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