Avaliação final sobre o Plano Director
Municipal do Porto
O processo que
levou à actual versão do Plano Director Municipal (PDM) do Porto é o resultado
de uma política virada contra os cidadãos, comprometendo muitas das
possibilidades de enveredar por um caminho mais respeitador dos requisitos de
uma cidade que se quer moderna e integrada no paradigma do Desenvolvimento Sustentável.
Agora que o
processo de revisão chega ao fim, a Plataforma CONVERGIR entende ser necessário
expor as suas conclusões sobre a versão final do documento e sobre o processo
de revisão do PDM.
Concretizando,
abordemos primeiro o processo de revisão. Se, no início, houve alguma abertura
por parte dos órgãos autárquicos para fornecer documentos e debater ideias para
a cidade, cedo se verificou que não passava tudo de boas intenções. E todos
sabemos o que com elas acontece. Apesar de uma ampla e profunda participação
dos cidadãos, quer de forma isolada quer através das associações cívicas, no
processo de discussão das várias versões que este documento norteador viu na
sua atribulada existência, a Câmara Municipal do Porto não deu resposta
adequada às questões levantadas, não considerou as sugestões apresentadas nem
aceitou discuti-las, como tinha prometido na fase inicial do processo. Lamentável.
Mais, afigura-se-nos que a discussão pública não cumpriu o seu objectivo, tendo
sido inútil. Serviu antes como instrumento de combate entre os partidos
políticos, que negociaram alguns dos pontos mais polémicos, como o índice de
capacidade construtiva, ao sabor dos respectivos interesses. Para cúmulo, o
instrumento tecnológico publicitado como mecanismo inovador de participação
pública, a página internet do PDM, para além de funcionar mal, muitas
vezes com informação incompleta, parece ter-se destinado apenas a contabilizar
participações sem cuidar de as encaminhar de forma adequada. Nem sequer vale a
pena analisar os sucessivos períodos de discussão pública, demonstrativos do
caos institucional.
Aborde-se agora a
substância do documento, em alguns dos pontos que nos merecem mais reticências,
uma vez que a sua totalidade não pode ser abordada num documento desta natureza.
Uma apreciação
global mostra uma subalternização dos temas ambientais em geral, atravessando
todo o documento, como pode ser constatado nos parágrafos seguintes, sem
qualquer ordenação por prioridades ou importância.
Os avanços e recuos
nos valores de superfícies máximas de impermeabilização, terminando numa
percentagem bastante superior ao que foi sugerido inicialmente ou nos diversos
documentos por nós submetidos a apreciação, mostra que o lóbi do betão terá
sido mais forte. Não cabe neste documento incidir sobre os efeitos nefastos de
uma forte impermeabilização dos terrenos urbanos mas, com este PDM, perdeu-se a
oportunidade de reduzir os seus impactos negativos.
A elevada pressão
exercida sobre a área do futuro Parque Oriental, nomeadamente com o seu
atravessamento e espartilhamento por estradas cuja necessidade imperiosa ficou
por demonstrar, mostra um projecto minimalista e uma falta de visão a longo
prazo, condicionando a implementação desta área verde prioritária a pouco mais
que ao leito de cheia dos ribeiros que o atravessam. Um admirável raciocínio de
desbaratamento do potencial ecológico, recreativo e patrimonial do Vale de
Campanhã.
No que respeita ao
Parque da Cidade, é reveladora a rede de interesses que levaram a apresentar
como inevitável mais um viaduto a cobrir a frente marítima, abrindo precedente
a novos atravessamentos, quando e onde os nossos projectistas considerem
relevante parta equilibrar os vários interesses em jogo. Basta ver o mapa da
cidade para prever onde serão propostos, mais tarde ou mais cedo. O texto que
descreve a UOPG nº 6 é lacónico e abunda em generalidades e palavras cujo
significado é dúbio. Não há qualquer dúvida que o PDM abre a porta a futuras
construções no Parque da Cidade, contrariando a promessa do actual executivo
camarário.
A expansão urbana
também não é contida, de todo em todo, no actual Plano. Apesar do discurso e da
aposta na renovação da Baixa, que merece o nosso apoio, não é verdade que o PDM
dê prioridade à recuperação desta zona, até porque um dos incentivos previstos
para este efeito consiste na atribuição de créditos de construção em zonas
livres da cidade a quem investir na Baixa. Ao todo, o PDM consagra 24 novas
áreas de construção (através de UOPGs) que, se vierem a ser concretizadas,
ocuparão parte substancial do solo ainda livre na cidade, ao qual poderia ser
dado um uso com maiores benefícios públicos. É certo que uma parte dos terrenos
inseridos nestas UOPGs manterá o uso público de espaço verde, dependendo do
coeficiente de ocupação do solo e das soluções em concreto a adoptar, mas é
lamentável que a planta de ordenamento não preveja, desde já, que zonas
deveriam ficar definitivamente salvaguardadas. Este aspecto é especialmente
relevante nas seguintes UOPGs:
·
Avenida Nun’Álvares: parece incrível que de uma
zona tão vasta a Câmara pretenda salvaguardar como área verde apenas uma
pequena área com uma forma disforme;
·
Requesende Norte / Viso (nº 4): para além de
atribuir capacidade construtiva aos terrenos da Quinta da Prelada de modo a que
sejam transferidos para as zonas livres aumentando a sua densidade, esta UOPG
chega ao cúmulo de permitir construção sobre o leito de cheia da Ribeira da
Granja, o que é evidentemente ilegal;
·
Regado (nº 7): as únicas áreas verdes previstas
situam-se na periferia da VCI, o que é inconcebível;
·
Companhia Aurifícia (nº 9): é contra os
pressupostos do próprio PDM que este quarteirão seja aberto à construção no seu
interior. Admitimos, contudo, e tão só, a abertura de um arruamento para peões
e ciclistas;
·
Escola Académica (nº 10) e Doze Casas (nº 12): idem;
·
Contumil (nº 17): é fundamental que se debata
profundamente aquando da realização do Plano de Pormenor o ordenamento em
concreto desta zona, visto que o PDM pouco diz.
O PDM deveria
reduzir substancialmente as áreas de expansão urbana e canalizar,
efectivamente, o investimento para a recuperação do edificado degradado, em
especial na Baixa. Contudo, para as zonas de expansão urbana que vierem a
existir, há que assegurar que respeitam a sua envolvente, impedindo a
proliferação de blocos de edifícios, vulgo torres, descontextualizados e que
degradam profundamente a imagem da cidade. É preciso fazer cidade e
recuperá-la, não depauperá-la tal como vem acontecendo!
São igualmente de
referir no PDM falhas no que respeita a políticas de energia e de água, apesar
de terem sido repetidamente sugeridas, justificadas e contextualizadas no
âmbito da poupança de recursos.
Pelo contrário, o
índice de edificabilidade foi alvo de apertado debate na comissão do PDM,
debate esse fortemente politizado, conduzindo a valores superiores ao que
consideramos adequado para a cidade do Porto, superiores mesmo ao valor
inicialmente proposto pela primeira equipa técnica responsável pela elaboração
do PDM.
Os transportes e a
mobilidade foram igualmente alvo de um tratamento pouco inovador, antes
mantendo as linhas actuais, de predomínio do transporte automóvel individual.
Na ausência de acerto com os documentos congéneres das cidades vizinhas, teria
sido importante prever uma melhor regulação do trânsito, usando vastas áreas de
estacionamento automóvel junto a linhas de transportes públicos, como por
exemplo os espaços destinados a recolha dos autocarros (Via Norte, Carcereira e
Contumil), instalando mais interfaces de transportes.
Para finalizar,
parece-nos importante referir que o julgamento dos cidadãos do Porto aparecerá
para avaliar a qualidade do trabalho desenvolvido e as intenções demonstradas
pelos responsáveis deste lamentável processo de revisão do PDM.
A Plataforma
CONVERGIR integra as seguintes Associações: APRIL, CAMPO ABERTO, FAPAS, GAIA,
NDMALO, OLHO VIVO, QUERCUS e TERRA VIVA.
Para mais
informações: Nuno Quental, 933753910; Paulo Santos,
967064913
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