«Tantas obras no Porto… ou o debate público de que a cidade precisa
A requalificação da Avenida dos Aliados, as obras no troço final da Avenida da Boavista, o imbróglio criado em torno do Túnel de Ceuta, a polémica passagem do metro em frente ao Hospital de S. João… Tanta empreitada na cidade do Porto serviu de mote à Tertúlia do Comercial de anteontem, subordinada ao tema “Tantas obras em fim de mandato”. Em discussão estiveram os projectos, a estratégia do actual executivo camarário, liderado por Rui Rio e, sobretudo, a necessidade de debate sobre as ideias e as intervenções no espaço público portuense, bem como a identidade da cidade.
Rogério Gomes, director do COMÉRCIO, lançou o mote para o debate: “Acho inadmissível a quantidade de obras que foram lançadas praticamente às escondidas da cidade”, observou, considerando importante “acabar com este procedimento de apresentar projectos acabados sem que a cidade se possa pronunciar sobre eles”.
Cristina Azevedo, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte (CCRD-N) foi ainda mais longe, notando que “o reconhecimento identitário dos cidadãos não pode ser passado a ferro” e vincando que a postura de não os envolver nas escolhas se traduz num “maior afastamento dos cidadãos, pela noção estrita de que nada podem fazer, porque tudo lhes é apresentado como um dado adquirido e de forma casuística”.
Com isto, estava, também, feita a ponte para outro dos temas que perpassou o debate: a coordenação das intervenções camarárias. Alcino Soutinho, arquitecto, referiu-se às empreitadas em curso como “soluções avulsas mal apropriadas pelos cidadãos” e vincou que, devido aos “poucos esclarecimentos sobre os processos”, fica “sem saber se os protestos são razoáveis”. Certa, na sua perspectiva, parece ser a “falta de visão e a falta de soluções globais para a cidade”, que se traduzem “num envolvimento pouco lógico que nos conduz ao pessimismo”.
Sílvio Cervan, presidente da Assembleia Municipal de Gaia tem opinião ligeiramente diferente: “A crítica que posso fazer é relativamente ao método. Embora tenha algumas dúvidas sobre a eficácia, o ideal seria envolver os cidadãos nas decisões”.
Seguiram-se as intervenções de Teresa Andresen e de Rui Moreira. E o presidente da Associação Comercial do Porto (ACP) insistiu na crítica a uma “atitude de sobranceria em relação ao que é nosso”, a qual, diz, produz “um sentimento de orfandade quando se anda na rua”.
Finda a intervenção do painel fixo das tertúlias, e dada a palavra ao público, as críticas surgiram da parte da Paulo Rangel, relator do programa de candidatura da actual maioria camarária. Rangel censurou as críticas ao presidente Rui Rio e o aparente descarregar de ressentimentos sobre o edil. O debate acabaria por deixar os aspectos mais concretos dos projectos e das obras um pouco de lado, centrando-se um pouco mais na actuação do actual executivo.
A arquitecta Manuela Juncal fez questão de responder, insistindo na necessidade de debate e vincando que, três anos passados sobre a tomada de posse de Rio, “o ponto de situação a fazer não é sobre as obras, mas sobre os métodos”. Também o arquitecto Alexandre Burmester lamentou a “política de imposição de obra”, em vez de uma “política de participação pública”. Tiago Fernandes, do blogue “A Baixa do Porto”, sustenta, igualmente, que “a Câmara tem de permitir a intervenção pública” e que é preciso deixar a sociedade civil “funcionar”.
Manuel Seabra, vereador socialista da Câmara de Matosinhos, aproveitou para censurar “a total ausência de estratégia de desenvolvimento da cidade nos últimos três anos”.
Luís Braga da Cruz, deputado do PS, centrar-se-ia no Plano Director Municipal (PDM), que considerou “cinzento”. Alcino Soutinho, por seu turno, considerou-o “redutor” e “absolutamente político”.
Elogios à SRU
Mas, o próprio Braga da Cruz fez questão de sublinhar que “no Porto nem tudo é mau”. A saber: “A Sociedade de Reabilitação Urbana da Baixa, ao procurar a intervenção ao nível do quarteirão de forma integrada, pode ter algum sucesso”. Já antes, Cristina Azevedo tinha observado que “parece residir na SRU a oportunidade de reverter um processo de falta de estratégia e de participação dos cidadãos”.
A terminar, Rui Moreira deixou no ar a pergunta, talvez para servir de tema para outra tertúlia: “Vale a pena discutir o Porto ou não? E, quando questionamos o papel da autarquia, não será preciso perguntar qual tem sido o papel da oposição?”. »
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