(reproduzido sem autorização… *)
«O problema da traça – Nuno Corvacho
(in Público -Local dia 9 de Julho 2005- “not on line” )
Há por aí uma palavra que costuma encher a boca daqueles que se preocupam com a conservação. É a traça, esse elemento que convem respeitar acima de todas as coisas e no qual se aconselha sobretudo a não mexer. Quase tudo é aceitável, quase tudo é admissível, desde que se mantenha a traça. Seja uma casa antiga, uma loja de charme, um velho palácio ou um centro cívico, a traça é, em qualquer dos casos, aquele irredutível limiar arquitectónico para além do qual nenhuma intervenção requalificadora deve ir, sob pena de transformar o ente a requalificar numa outra coisa qualquer. E, quando esta se mantém, não falta entre esses militantes da conservação quem se regozije: foi o café central que se transformou numa casa de hamburgueres, mas do mal o menos, porque o proprietário não mexeu na traça; é o velho palácio que vai virar pousada mas longe da empresa hoteleira mudar a traça, ainda bem!; foi a praça antiga que se viu violentada, esburacada e esventrada, mas vá lá, no fim de contas, sempre se conseguiu salvar a traça.
Desde o início do seu mandato na câmara do Porto que Rui Rio se preocupou em manter a traça. Fosse ele onde fosse. Mais importante do que pôr a cidade a mexer era não estragar e, se possível, reparar os estragos que outros tivessem feito. Foi esse o espírito do ataque à “pesada herança” da Porto 2001, sempre com o cuidado, repete-se, em manter a traça.
Paradigmático foi o episódio da Praça de Carlos Alberto.
Lembremo-nos que, ao chegar à câmara, Rui Rio encontrou, em lugar desta praça da Baixa portuense, um buraco, uma entre as várias obras deixadas par acabar pela Porto 2001. E ter-se-á arrepiado, porque, naqueles anos melancólicos do buraco de Carlos Alberto, descobrir ali no meio uma traça discernível era como procurar uma agulha num palheiro. Indiferente a qualquer projecto de transformação que pudesse estar na calha, o autarca só descansou quando conseguiu tapar o buraco. E o que lhe interessou foi tapá-lo, pura e simplesmente, ou seja, revolver as terras outra vez, ajeitar tudo de novo à superficie, refazer o jardim e até recolocar lá no meio o velho monumento aos mortos da Grande Guerra. Tudo direitinho e sem mácula e na medida do possivel idêntico a fisionomia que a praça tinha antes da intervenção. Em suma, devolvê-la, objectivo supremo e último, à sua traça original. Para que nenhum portuense digno desse título e amante da sua cidade pudesse reclamar e dizer que lhe tinham tirado a Praça de Carlos Alberto.
Rui Rio sempre afirmou como objectivo político que a cidade do Porto valorizasse o que tem de diferente e único (e que radicahnente a distingue de qualquer outra cidade), nomeadamente a sua Baixa, e foi dele o comentário que serviu como uma espécie de bandeira cultural, que a cidade devia “polir os seus emblemas”. Agora que, à semelhança do que acontecia com a Praça de Carlos Alberto há uns anos, a Avenida dos Aliados está objectivamente transformada num buraco, par força do estaleiro do metro, e quando se esperava que, ao menos em nome da coerência, Rui Rio se limitasse a esperar que a obra terminasse para depois chegar lá e tapar o buraco, sempre com o cuidado de manter a traça, nada disso aconteceu.
Alguém o terá convencido de que o rebuliço do metro seria um óptimo pretexto para ficar na história da cidade, transformando de alto a baixo a Praça da Liberdade e a Avenida dos Aliados. A caução de ter ao seu lado dois monstros sagrados da arquitectura como Siza Vieira e Souto Moura tê-lo-á levado apressadamente a pensar que, desta vez, tal não fosse mau mudar a traça. Uma traça, quando é de autor, mesmo que não seja A TRAÇA, já passa a merecer respeito.
Mas Rio não o fez da melhor maneira: na pressa de fazer obra, nem sequer fez preceder a intervenção de discussão pública e tem agora contra ele um movimento de cidadãos que não aceita a intervenção e promete recorrer a todos os meios de contestação ao seu alcance para que a intervenção não vá para a frente. De facto, dificilmente se percebe que tenha sido um simples problema de largura de passeios (exigido pelos acessos à estação de metro) a levar um autarca outrora tão cioso em conservar as traças a querer agora alterar as praças. E logo dois emblemas como aqueles, que aparentemente, e na lição de Rio, só estariam era a pedir que lhes dessem uma polidela.»
* Ainda actual, este texto é uma das poucas peças jornalísticas publicadas sobre a intervenção na Avenida dos Aliados. Solicitei repetidamente autorização para a sua reprodução e como estou farta de esperar avanço com a publicação. Pode ser que assim digam qualquer coisa…
Em defesa do Jardim e Monumento da Rotunda da Boavista
PEDIDO DE INFORMAÇÃO À EMPRESA METRO DO PORTO S. A. E À CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO Colocado em 12...
Talvez, para alguns, não seja interessante a sua divulgação!
è difícil perceber muito bem para onde vai a opinião do autor…
Eu, como já o escrvi noutros fóruns, agradeço aos deuses a reposição da Praça de Carlos Alberto como antes estava – com soldado desconhecido e tudo, ou o autor acha que se deveria lá pôr uma moderníssima estátua do nosso Cutileiro? – e sou também contra as obras nos Aliados orquestradas por Siza e Robin.
O autor é que parece cair em contradição…
Alexandre Borges Gomes
Luanda.
Pois…
O autor não se pronuncia sobre o projecto; a única critica evidente recai sobre a contradição de RR para quem a “traça” foi tão importante no caso da reposição de Carlos Alberto e agora, no caso que nos preocupa e revolta, já não interessa para nada!
A propósito “linkei” para a entrada “Descubra as diferenças” do dia 14 de Abril!