A Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente organizou nos dias 16 e 17 de Dezembro de 2005, no ISCTE, o XVI Encontro Nacional das ADA/ONGA, com a presença de representantes de 78 ADA/ONGA e equiparadas e empresas do sector do ambiente bem como diversas personalidades convidadas, de que se destacam o Secretário de Estado do Ambiente, Prof. Humberto Rosa; Prof. Luís Reto do ISCTE, Pedro Serra das Águas de Portugal; deputados da AR e representantes do CNADS – Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, do Instituto da Conservação da Natureza.
Situação actual da seca
Apesar da seca meteorológica já ter sido ultrapassada, a situação actual ainda é de seca hidrológica. Uma das lições a retirar da situação é a de que o recurso água é limitado, mesmo em época sem seca, pois devido às Alterações Climáticas a tendência da sua ocorrência é cada vez maior.
Foi reconhecida a importância das medidas de curto prazo tomadas pela Comissão da Seca 2005, que integrou um representante das ONGA. O trabalho que desenvolveu permitiu que o abastecimento urbano não tenha sido afectado (os sectores do turismo e da agricultura entenderam que essa era a prioridade).
Relativamente às hidroeléctricas em 2003 as emissões foram relativamente reduzidas mas em 2005, em situação de seca, aumentaram as emissões.
A desertificação não é compatível com o desenvolvimento sustentável, mas tem ocorrido em Portugal nas zonas costeiras, locais de melhores solos, devido a diversos factores: liberalização da economia, crescimento do turismo desordenado, da horticultura e da indústria. Não podemos continuar a ocupar os melhores solos com construções (betonização). Os erros dos processos agrícolas bem como as Alterações Climáticas estarem a aumentar os níveis de precipitação quando ela não é precisa, ou seja, no início do Inverno agravando a erosão em Portugal onde a maior percentagem de solos já é de elevado risco. Por outro lado os níveis de salinidade do solo têm vindo a aumentar.
Como forma de evitar as falhas no abastecimento nas zonas rurais foi referida a necessidade de se fazer conservação da água durante o Inverno (para uso doméstico e para o gado em tempo de seca) por processos de cisternas e charcas para retenção de água; lavouras para manutenção da matéria orgânica e sementeira directa. Parte da solução passa também por se reduzirem as fugas na rede e gerir devidamente a procura.
Assim:
Há que equacionar qual o tipo de agricultura a adoptar para o nosso país, porque o Pinhal está doente, a pasta de papel já não é rentável, etc. É necessário fazer-se investigação dirigida, por um lado (que em Portugal não existe) e ter uma estratégia política de intervenção. Também será necessário aliar as confederações (CAP e CNA) no debate sobre a seca que deve ser alargado.
Há que manter agricultura nas zonas florestais para se contribuir para a não ocorrência de fogos florestais, que apesar de não ser rentável deve ser vista como prestadora de múltiplos serviços.
Parte da solução passa também pela contenção da procura de água, especialmente em determinadas zonas como o Mediterrâneo e pelo aumento da eficiência da distribuição. Também a reutilização de águas residuais é importante (em Madrid 80% das águas residuais são reutilizadas na agricultura).
Há que aumentar o custo da água para o regadio (que é muito baixo por não internalizar os custos ambientais, sociais e ecológicos), embora a solução também não passe só por aqui.
Por outro lado a questão de limitar-se o crescimento das urbanizações nas zonas litorais deve ser promovida com base nos aumentos dos consumos de água, o que deve ser considerado um impacte ambiental negativo e significativo que poderia chumbar alguns projectos.
A dessalinização da água não deve ser vista como uma solução pura porque exige a queima de combustíveis fósseis com impactes indirectos.
Relativamente ao Convénio assinado entre Portugal e Espanha foi referido que Portugal cedeu mais do que Espanha (nas bacias a norte) para “garantir” água para Alqueva deixando-se influenciar.
A Directiva Quadro da Água refere no Artigo 3º a necessidade de demarcação de bacias hidrográficas. No caso de Portugal e Espanha com vários rios ibéricos a Directiva aponta para a necessidade de considerar essas bacias como internacionais.
Neste âmbito a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente anuncia que organizará com a congénere espanhola Ecologistas en Acción uma cimeira ibérica subordinada ao tema Bacias Hidrográficas Internacionais (rios Minho, Lima, Douro, Tejo e Guadiana) em Abril de 2006 em Lisboa, tendo em vista acelerar a constituição das respectivas comissões de bacia e garantir a representação das ONGA nesses órgãos.
Energia Solar
Os sistemas fotovoltaicos são uma solução possível para produção de energia mais limpa e segura. Há 50 anos que foi apresentada a 1ª célula (ainda com pequena eficiência e cara). Actualmente 90% do mercado da energia solar é dominado pela tecnologia do silício cristalino. O tempo de vida destes sistemas é de 20 anos e permite produzir energia onde ele é necessária.
Foram referidos dois tipos de sistemas de oferta de energia fotovoltaica * ligados à rede eléctrica ou sistemas autónomos (com baterias para armazenamento). Este último ainda é o dominante em Portugal (casas isoladas) mas tem problemas com o destino final das baterias.
É necessário alterar a legislação numa perspectiva do produtor-consumidor e agilizar os pedidos de licenciamento não demorem tanto tempo. A legislação sobre edifícios deve “impor” a instalação de sistemas solares (térmicos e fotovoltaico). Em Portugal, com a quantidade de horas de sol anual, não se tem investido nesta área comparativamente com a Alemanha, por exemplo.
O custo para o consumidor da energia de fonte solar é ainda muito superior ao custo de venda da energia de produção com origem no carvão, exactamente porque esta última não internaliza os custos ambientais, entre outros.
Energia Eólica
Em Portugal continua a centrar-se o problema na questão da oferta e não da procura, ou seja, seria preferível promover a diminuição dos consumos de energia (que aumentaram cerca de 10% na última década sem benefícios em termos de PIB).
O parque Eólico tem vindo a crescer. Portugal é dos países da Europa que mais produz energia de fontes hidroeléctricas. No entanto com crescimentos de consumo na ordem dos 5% a produção por esta fonte só tem assegurado cerca de 6% dos consumos (o restante tem sido assegurado essencialmente por energia fóssil). Foi ainda referida a Convenção Europeia da Paisagem que deve ser entendida não como uma limitação às eólicas mas deve ser tida em consideração, especialmente em zonas com estatuto de protecção.
Energia Nuclear
Nunca foi verdadeiramente justificada a viabilidade económica em Portugal da produção de energia através de centrais nucleares.
Os países com maior peso no nuclear são o Japão, França e Alemanha e Estados Unidos (Espanha também tem). Tem tido um pequeno acréscimo a nível mundial. O carvão continua a ter um peso elevado (é um dos piores em termos de emissões de CO2). Uma das questões levantadas pelo nuclear para além da segurança tem a ver com a necessidade de armazenamento dos resíduos. Quando as centrais foram construídas no mundo há cerca de 50 anos pensava-se que iria surgir uma solução para os resíduos nos dias de hoje, mas isso não aconteceu.
Os custos mais significativos da energia nuclear têm a ver com os caros sistemas de segurança (nomeadamente para se fazer face aos riscos das chamadas bombas sujas e ao terrorismo) e com a contenção e armazenagem de resíduos (solução de curto prazo).
Na Finlândia tem-se discutido bastante a questão económica. Os custos de operação e manutenção são mais elevados no nuclear, os custos de manutenção são mais elevados com o carvão e quase inexistentes no gás natural. O custo da matéria prima é baixo para o nuclear e muito alto para o gás. Para o nuclear há ainda que considerar a derrapagem financeira. Há cash flows significativos na exploração, mas no final é muito negativo. Do ponto de vista estritamente económico há que referir o custo do capital, pois é necessário grande investimento inicial. A questão do protocolo de Quioto tem sido referida como um balão de oxigénio para o nuclear.
A questão da energia não tem só a ver com o custo porque de facto é possível produzi-la mais limpa, com mais ou menos investimento.
Assim:
A questão da solução dos problemas relacionados com a produção e consumo de energia tem que ser vista a dois níveis. Por um lado, através da promoção da diminuição da necessidade de energia, e por outro, e produzir energia mais limpa, sem impactes ambientais significativos, considerando o Protocolo de Quioto,
A nível das renováveis Portugal deveria apostar na energia solar * quer fotovoltaica quer térmica, tendo por base as horas de sol e também pela eólica como complemento.
Por outro lado tendo por base o tema da Seca, influenciada pelas Alterações Climáticas, foi referido que o problema do consumo de energia não passa apenas pela questão da electricidade, mas também pela questão dos transportes, principal responsável pela emissão de CO2 para a atmosfera. Neste âmbito há que adoptar medidas restritivas da utilização do automóvel promovendo alternativas e diminuindo a dependência dele e em paralelo equacionar a questão do hidrogénio.
Refira-se que na abertura do XVI Encontro Nacional de Associações de Defesa do Ambiente o Governo juntou-se aos ambientalistas no NÃO ao Nuclear. Humberto Rosa, Secretário de Estado do Ambiente, em representação do Governo, afirmou que o tema do “nuclear não é um tabu para este Governo”. O actual Governo está contra a energia nuclear e não avançará com esta solução, tal como afirmou o Primeiro-Ministro José Sócrates.
Assim a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente desafia os candidatos à Presidência da República para um debate sobre o problema do nuclear, obrigando-os a tornar pública a sua posição.
Incêndios florestais
Foi referida a monocultura como uma das causas da propagação dos incêndios.
Em Portugal continua a fazer-se combate aos incêndios ao invés de se investir na prevenção da sua ocorrência e na sensibilização para o problema. É sobretudo um problema político e de alguma falta de organização que é necessário inverter. Por outro lado é também necessária legislação para permitir uma actuação concertada e adequada.
Recursos hídricos subterrâneos
Os efeitos da seca sobre os recursos hídricos são mais visíveis a nível superficial (lagos, rios, albufeiras, etc.). Mas quando há seca a maioria dos drenos deixam de captar águas, as nascentes secam. Alguns furos também secam ou porque não são muito profundos ou não há porosidade a nível inferior e por isso não vale a pena furar mais.
Em cenário de seca corre-se ainda o risco de se fazerem captações com técnicas erradas que contribuem ainda mais para a degradação da qualidade das águas subterrâneas. Devido à falta de água subterrânea ocorreram alguns abatimentos de terrenos e alterações na qualidade de água que comprometem as culturas, para além da alcalinização e salinização dos solos.
Consequências da seca para a diversidade biológica
A seca também afectou a diversidade biológica dado que ela produz perda de biodiversidade a nível global (para além do declínio da qualidade da água, solo, risco de incêndios) porque influenciam a abundância das espécies, a alteração da distribuição geográfica, a degradação, alterações de comportamento, entre outros. No âmbito da convenção das Nações Unidas para a biodiversiddade foi criada em 2005 uma proposta de orientações para promoção de sinergias entre actividades relativas à biodiversidade, degradação da terra (desertificação) e alterações climáticas. Esta proposta deverá ser adoptada em 2006.
Foi referido um exemplo do trabalho desenvolvido pelo ICN (Instituto de Conservação da Natureza) para salvaguarda de espécies no período de seca na bacia do Guadiana, nomeadamente a monitorização da ictiofauna.
Estratégia Europeia de Solos
A política de solos é uma política sem estratégia comum. Nos países do sul da Europa Portugal aparece junto aos países com problemas de erosão. O novo pacote financeiro da EU para o Desenvolvimento Rural deve ser orientado para a preservação do solo.
A desertificação já abrange cerca de 36% do território nacional. O MAOTDR tem que se organizar de forma a interferir na política de solos e os impactes do uso dos financiamentos implicados naquele pacote e cooperar com o Ministério da Agricultura nesta matéria.
A estratégia de solos e a estratégia de ambiente urbano estiveram recentemente em discussão pública sem conhecimento da maioria das pessoas e sem divulgação com a consequente pequena participação.
O plano tecnológico não considera o solo como prioridade nem introduz qualquer medida a nível de políticas de inovação e conhecimento. Ora a política de solos devidamente aplicada pode gerar emprego, fixar pessoas no interior, criar riqueza e ser uma oportunidade. Já não se podem alargar mais as áreas urbanas com todos os impactes ambientais, sociais e económicos que daí decorrem. Pelo contrário é necessário e urgente recuperar os centros urbanos degradados.
A política de defesa do litoral obriga a um integração das competências num organismo único. Com efeito aquelas estão dispersas por mais de duas dezenas de entidades e assim só é possível uma estratégia de defesa da costa combatendo a atomização promovida pelo MAOTDR (de que o novo POLIS anunciado para a defesa das ilhas barreira em Faro é um exemplo).
Considera-se imprescindível uma política de recuperação de locais degradados no sentido de diminuir a pressão urbanística em solo não edificado, tal como está a ser feito, por exemplo, em Inglaterra.
Foi lançado o desafio de abrir um debate sobre esta política e solicitar desde já o parecer dos candidatos à Presidência da República. Impõe-se naturalmente iniciar um processo educativo dos cidadãos nesta matéria.
Desertificação e gestão florestal
È necessário cumprir a convenção das nações unidas do combate à desertificação. A comissão da PANCD identificou 5 áreas piloto para trabalhar – arribas do Douro, Mação, margem esquerda do Guadiana e Serra Algarvia (em função do feedback das pessoas que estão a trabalhar no terrreno). Estas zonas coincidem com zonas de população reduzida e abandono da agricultura.
2006 será o Ano Internacional dos Desertos e Desertificação pelo que deverão ser realizadas iniciativas que abordem este tema.
Agricultura biológica/biodinâmica
A agricultura biodinâmica pretende, adicionalmente a prática da agricultura biológica (que não recorre a pesticidas de síntese para a produção agrícola), curar o solo, sendo pois mais exigente e “evoluída” que a segunda. De referir que a Confederação Portuguesa das ADA tem sublinhado a necessidade de defesa, promoção e incentivo à agricultura biodinâmica desde 2003.
Permacultura
Este sistema de cultura implica uma planificação de habitats humanos em sinergia com os padrões da natureza (perma = permanente). Tem por base princípios éticos e técnicos que garantem uma relação harmoniosa do homem com a natureza. Promove a policultura, a eficiência energética, a criação de jardins florestais, a opção por economias alternativas e o desenvolvimento de ecoaldeias, etc.
0 comentários