RUAS LIVRES
ESPAÇOS LIVRES
CIDADES REGENERADORAS
Colocado em 2 de junho de 2020
Após os meses de confinamento, tudo parece estar a voltar ao «antigamente» – apenas de há três meses atrás. Até os engarrafamentos de trânsito já voltaram… Mas não falta também quem tenha mudado o seu olhar sobre a realidade, e muito sobre as cidades.
1 – Ruas Livres
Além de vários outros artigos e rubricas sobre o assunto neste espaço virtual – e cujas ligações indicamos mais adiante –, o interesse do tema e pelo tema por parte de não poucos fez-nos criar esta nova rubrica. A qual começa com o texto de Pedro Leitão que recebemos em mensagem e de que derivámos o título.
2 – Illichville
Pouco depois recebemos, espontaneamente também, uma reflexão de Dalila Pinto, sócia e voluntária da Campo Aberto, que aponta fontes de inspiração para uma necessária transformação das cidades. Parte ela de uma palavra inventada, «a cidade de Ivan Illich= Illicheville», que remete para o pensamento de um autor notável e do seu livro Para uma história das necessidades, publicado em 2018 em tradução portuguesa e que se pode encontrar na biblioteca e na «lojinha» da associação.
A Illichville é talvez utópica, como nota a autora, mas não deixa de ser uma meta, talvez inalcançável mas que em cada passo dado na direção certa tornará melhores as cidades e mais habitáveis, harmoniosas e agradáveis de se viver.
A acrescentar às experiências de Berlim, Paris e Milão citadas por Dalila Pinto, é possível ver outras semelhantes num outro espaço digital da Campo Aberto criado expressamente para a defesa e criação de espaços vivos, verdes e mais livres de excessos construtivos. Não deixe de o visitar, em especial sobre o que se passa em três grandes capitais europeias (Berlim, Paris, Bruxelas) para trazer a agricultura à cidade.
3 – As cidades face às alterações climáticas
O terceiro elemento desta nova rubrica é uma comunicação da associação sobre o que as cidades podem fazer para contrariar as alteraçõees climáticas. Escrita a pedido de um município – não sabemos se receberam o nosso contributo –, pensamos que poderia ter interesse para muitas outras cidades portuguesas – e porque não para as da Área Metropolitana do Porto a começar pelo Porto ele próprio?
4 – Criar Cidades Regeneradoras
O elemento seguinte é uma nota sobre um livro do ecologista e urbanista britânico Herbert Girardet (Criar Cidades Regeneradoras – Creating Regenerative Cities). Autor de um pequeno livro anterior (Criar Cidades Sustentáveis, título da edição portuguesa, esgotada, mas que pode ser consultada na biblioteca da Campo Aberto), que continua atual, Herbert Girardet sentiu necessidade de ir mais longe, mais além da sustentabilidade, palavra que, mais do que a ideia originária, se tornou algo vazia dado o uso excessivo a propósito e a despropósito a que tem sido sujeita.
Evitar que a poluição automóvel regresse às cidades
Na sequência destes vários contributos, chamamos também a atenção para uma carta endereçada pela liga de associações Estrada Viva aos mais altos magistrados, governantes e autarcas, na qual instam a evitar que a poluição automóvel regresse às cidades. Insistem em que nelas se retire protagonismo ao automóvel, seguindo o exemplo de outros países e de algumas grandes capitais, como Paris, que adotou o conceito de «cidade dos 15 minutos». O qual visa permitir, às pessoas que possam e queiram, permanecer o máximo possível dentro dos seus bairros, multiplicando jardins e transformando ruas locais em lugares de fruição para crianças, adultos e idosos. Um conceito próximo da «unidade de vizinhança» (do urbanista Clarence Perry no início do século XX), que ainda em 31 de maio de 2020 o Arq. Manuel Correia Fernandes explanou em entrevista-debate organizada por Nuno Quental e divulgada pela Campo Aberto.
Veja também neste espaço digital
Observatório do Urbanismo
Cidade das Crianças e Cidade das Bicicletas
Mais que nunca: discutir a cidade
Cidades Mais Verdes Cidades Mais Amigas
A Árvore e a Cidade
1 – Ruas Livres
TRANSFORMAÇÕES DO ESPAÇO PÚBLICO NA SEQUÊNCIA DA PANDEMIA
Pedro Leitão (19-05-2020)
Enquanto portuense e cidadão interessado, e por reconhecer que a Campo Aberto tem desempenhado um ótimo trabalho em prol dos valores ambientais na região do Porto, permitam-me partilhar convosco algumas preocupações.
Na situação atual de pandemia, em que os contactos sociais estão suspensos ou mantidos ao mínimo, os habitantes das cidades parecem estar a descobrir a importância de pequenos prazeres que antes desvalorizavam ou desconsideravam perante a abundância de alternativas.
As horas mais preciosas
As horas passadas em espaços verdes de lazer para a prática de exercício, para convívio social em condições de maior segurança, ou para um simples passeio de espraiamento dos sentidos após longos dias de confinamento, tornaram-se para muitos nas mais preciosas da semana.
É provável que esta seja uma das grandes transformações operadas pela pandemia: a relação que temos com o espaço público, e em particular os espaços públicos verdes. Nesse sentido, gostaria de apelar a uma reflexão em torno da importância da sua valorização, de forma a melhorar substancialmente a cidade pós-pandemia.
Que Porto pós-pandemia nós queremos?
O estado atual do Porto, de ruas desertas de carros, dos grandes parques asfaltados sem veículos estacionados, das dezenas de pessoas que correm e se exercitam ao fim da tarde em ruas outrora congestionadas, deverá servir para nos questionarmos sobre a ordem de prioridades vigente. Temos assistido a pequenas iniciativas por parte das entidades camarárias que apontam nessa direção: a ocupação de lugares de estacionamento por esplanadas; o corte das avenidas marginais ao fim de semana para usufruto da população; o apelo ao uso da bicicleta como meio de deslocação seguro em tempo de pandemia. Devemos aproveitar este embalo para, em prol de um aumento da qualidade de vida dos habitantes e de boas condições de saúde pública, introduzir no ordenamento das cidades melhorias significativas no espaço comum, tornando-o mais aprazível e acessível a todos.
Pegando no exemplo do Porto, onde habito e cujo debate acompanho diariamente, a flagrante carência de espaços verdes, em particular nas freguesias centrais da cidade (mas não só), é uma matéria a olhar com atenção. Em certas zonas centrais e densamente ocupadas, bem servidas pelo transporte público, não faz sentido que o estacionamento na via pública seja tão prevalente. Alguns parques de estacionamento, totalmente obsoletos perante a oferta de metro e autocarros, poderiam dar lugar, com um esforço mínimo de investimento, a novos jardins e parques verdes de usufruto comunitário. Deixo apenas alguns exemplos: a Praça Coronel Pacheco, o estacionamento das Águas Férreas, o Largo da Lapa, o Largo do Padre Baltasar Guedes, o Terminal Rodoviário do Parque das Camélias, os arruamentos secundários na orla da Av. D. Afonso Henriques, entre outros exemplos.
Respirar melhor: novos espaços verdes e mais espaço público
Para além destes pequenos espaços de convívio, outros maiores, já projetados ou em planeamento, deveriam ser executados com redobrada celeridade: o Parque Verde da Asprela; o futuro parque da Lapa, nos terrenos a norte da linha do metro; a valorização das margens das ribeiras, em particular da Granja, de Paranhos e de Aldoar, que atravessam zonas urbanas muito povoadas; a valorização como ecopista do antigo Ramal da Alfândega e preservação natural das encostas das Fontainhas, Quinta da China e Freixo.
Outras medidas, como o alargamento de passeios e arborização de ruas, serão essenciais para tornar a cidade de proximidade mais convidativa, aprazível e respirável. No imediato, seria importante melhorar a acessibilidade dos espaços verdes existentes. Uma medida fácil de implementar seria o alargamento do horário de funcionamento de alguns parques e jardins. Outra medida importante seria a abertura à cidade da Quinta da Prelada, um enorme espaço verde que serviria a grande mancha urbana do centro.
Outro desenvolvimento urbano é possível
Estas medidas não são incompatíveis com a consolidação urbana do Porto, que nos últimos anos veio a ganhar um forte impulso. Nesse sentido, não são um entrave ao desenvolvimento económico e social mas, por assentar em factores de sustentabilidade (qualidade de vida das populações, incentivo das deslocações por transporte público e privado não poluente, condições favoráveis ao comércio local, animação social e cultural da cidade), são antes factores da sua promoção.
Sabendo que a vossa voz é frequentemente ouvida pelas instituições camarárias, algo que apenas pode derivar do bom trabalho que desempenharam ao longo dos anos, deixo nas linhas acima o apelo para que possamos, no futuro imediato e no amanhã pós-Covid, construir uma cidade mais sã, mais verde e, desta forma, mais convidativa ao contacto humano em sintonia com a natureza.
Nota de 31-05-2020 Entretanto a CM Porto anunciou algumas medidas que irão melhorar a acessibilidade pedonal, sobretudo na Baixa, ao fim de semana, bem como mais ciclovias até ao final do ano. Mas julgo que o espírito do texto se mantém.
2 – Illichville
Dalila Pinto (21-05-2020)
Da cidade ideal à cidade real: utopias, distopias e algumas ideias com pés na terra
1 – Illichville
Sonhamos com a cidade ideal, a cidade onde homens e natureza convivam pacificamente numa harmonia perfeita. Na cidade ideal não haverá mais a agressão do betão a rasgar a terra e a arranhar os céus. As formas e os materiais serão naturais. A arquitetura será biomimética. Não haverá lugar para automóveis, nem para o supérfluo nem para a sociedade de consumo.
Em Illichville, tal como na cidade ideal, não circulam carros nem há estradas nem parkings. Illichville é uma pequena cidade de 30.000 habitantes, que se pode atravessar facilmente a pé ou de bicicleta.
Illichville está rodeada por três anéis:
– o anel interior está coberto de jardins, hortas, vinhas e campos que fornecem os alimentos necessários;
– o anel do meio é composto por campos que produzem as fibras necessárias para o vestuário;
– o anel externo é composto de prados e florestas.
Illichville funciona em autoprodução agrícola e artesanal.
Illichville é a cidade ideal, a utopia imaginada por artistas americanos partidários do decrescimento, no prolongamento das ideias de Ivan Illich.
2- Muito longe de Illichville
As cidades onde hoje habitamos estão muito longe de Illichville e muito perto da pior das distopias. Infelizmente podem mesmo vir a ser a pior das distopias.
Vivemos cercados por uma rede, uma teia de aranha, a nível do solo e uma outra teia por cima das nossas cabeças.
A cidade inteligente, que nos querem vender como a mais bela das utopias, assenta em seis pilares smarts[«espertos»]: smart economy, smart mobility, smart environment, smart governance, smart people e smart living [economia / mobilidade / ambiente / governação / habitantes / estilo de vida]. Ora, para produzir tanta inteligência será necessária muita energia e uma rede, a tal teia de aranha, densíssima, por cima das nossas cabeças. Para já, um sistema 5G será suficiente (?) mas outros sistemas cada vez mais poderosos se seguirão.
Não duvido que a smart city seja realmente smart e facilitadora do quotidiano a vários níveis mas duvido que não acarrete mais malefícios que benefícios.
«A cidade como plataforma, como um centro de comando central que permita tomar decisões em tempo real através dos dados recolhidos e tratados nos vários sistemas que a integram….. Um sonho utópico que não o é (ainda) e que está a ser construído em Portugal.» Assim começa o artigo publicado no Semanário EXPRESSO de 9 de Maio de 2020, com o título «Viagem ao Cérebro da Cidade Inteligente».
3 – Esquecer utopias e distopias e tentar melhorar o presente
Algumas ideias com pés na terra vindas de Paris, de Berlim, de Itália, daqui e dali e da minha cabeça.
Paris, cidade verde
– Végétalisons Paris [Vegetalizemos Paris]
https://www.paris.fr/duvertpresdechezmoi
«O verde perto de minha casa» [Du vert près de chez moi], com mais de 1 128 projectos realizados, estimula o cidadão a plantar em calçadas, telhados, muros, praças, jardins e hortas.
– Mains vertes [Mãos verdes: «avoir la main verte», ter a mão verde, ter jeito e amor para semear e plantar com êxito]
Hortas comunitárias
Centenas de projectos realizados.
Nos bairros mais pobres e de imigrantes faz-se parceria com o «Vergers Urbains» [Pomares Urbanos], um misto de ONG e empresa ecológica.
– La Recyclerie [a Recicladora]
Este projeto combina agricultura e comércio.
Tem horta, agrofloresta, apiário e aviário.
No sector comercial tem restaurante, dois bares, café, local para cursos e palestras.
Negócios e agricultura em parceria e benefício mútuo.
«Quem está no métier sabe que sobreviver na cidade plantando alfaces em pequenos terrenos, altamente valorizados, é impossível. Então, fazendo um condomínio de empreendimentos focados na regeneração socioambiental, é possível constituir um ciclo virtuoso económica e financeiramente sustentável.» Claudia Visoni (jornalista e ambientalista)
A Recyclerie não está sozinha e alimenta uma rede eco-otimista
– La Caverne
Quintinha subterrânea – produz cogumelos.
– La Ferme du Bonheur [A Quinta da Felicidade]
Em Nanterre: quinta urbana e espaço dedicado a atividades artísticas e comércio solidário.
Berlim
O papel do planeamento urbano na mitigação das alterações climáricas
Berlim – cidade-esponja
A cidade-esponja, Schwammstadt, quer mais árvores, telhados cobertos com musgo e relva, pavimentação de ruas e estradas resistente ao calor, charcos urbanos e áreas permeáveis para absorver e armazenar água das chuvas. O escoamento das águas será lento pois o escoamento rápido acarreta consigo todo o tipo de lixo.
– A construção na cidade-esponja
A cidade vai usar poderes para negociar acordos com construtoras para que os edifícios sejam adaptados a um clima mais quente evitando ar condicionado com alto consumo de energia.
Os telhados devem ter cobertura verde.
Impedir alastramento urbano e não aumentar densidade de moradores por km2 é também um dos objectivos da cidade-esponja.
Itália
Cidades como Milão preparam uma mobilidade mais sustentável implementando o uso da bicicleta.
Ainda em Milão a nova arquitetura faz-se verde.
Stefano Boeri desenha as suas maravilhosas «cidades-floresta»: edifícios com coberturas verdes e terraços-jardins.
De toda a Europa nos chegam ideias lindas como aquela (que li já não sei onde) dos jardins com árvores de frutos que poderão ser colhidos livremente por quem os quiser saborear.
3 – As cidades face às alterações climáticas
Campo Aberto (20-01-2020)
Uma pergunta que os cidadãos podem colocar a si próprios ou aos autarcas dos seus concelhos: que podem as cidades fazer face à emergência climática? Porque já nos interrogaram sobre o assunto, propusemos as seguintes linhas de atuação. Outras podem existir, evidentemente.
Clima e tráfego automóvel
O primeiro aspeto é, naturalmente, o esforço para a diminuição das emissões de gases com efeito de estufa. Nas cidades, eles são provenientes em grande parte do tráfego automóvel. Quanto ao tráfego de atravessamento em infraestruturas como estradas e autoestradas nacionais, pouco cada município poderá fazer a não ser recorrer aos bons ofícios da administração central. O mesmo talvez já não aconteça com a ordenação e o condicionamento do tráfego interno ao concelho ou fora dos eixos de atravessamento externos, por forma a obter alguma redução de emissões.
Mais importante ainda poderia ser a disciplinação do trânsito através da multiplicação das zonas de 30km/h em todos os locais que possam considerar-se residenciais, e que são ou poderiam ser a quase totalidade do território de cada concelho urbano, beneficiando enormemente por arrasto os peões e os ciclistas, sempre sob a perigosa ameaça da proliferação automóvel. O que incentivaria muitos a trocar o carro pela deslocação a pé ou de bicicleta nos percursos curtos, os quais, segundo estudos efetuados em várias partes do mundo, representam uma fatia importante, ou mesmo a mais importante, das deslocações totais. Evidentemente, a melhoria dos transportes públicos, sobretudo por meio de maior frequência, e também de maior cobertura do parque residencial, seria outra poderosa alavanca.
Ainda no domínio das deslocações, outro aspeto em que o apoio decidido do município poderia fazer toda a diferença, seria a generalização dos pedibus («autocarros pedestres») na condução dos alunos às escolas, encurtando significativamente as distâncias a percorrer de carro pelos pais e famílias. Em tudo isso, e ao contrário do espantalho que por vezes se agita, a disciplinação do tráfego automóvel, ao mesmo tempo que combateria as emissões carbónicas, redundaria num maior conforto urbano, tranquilidade e prazer de viver.
Eletricidade fotovoltaica
Um segundo aspeto, ainda no domínio da energia e portanto no da diminuição de emissões, seria o incentivo planeado e coerente à produção de eletricidade de origem fotovoltaica de microgeração, instalada em telhados, coberturas de prédios, até varandas, e outros locais propícios, produção diretamente destinada aos produtores e à rede, dispensando portanto o recurso a baterias que, pelas dificuldades e prejuízos ambientais que acarretam no domínio da extração de matérias primas e da poluição, representam o calcanhar de Aquiles da energia solar, apesar desta ser a mais promissora de todas as formas de energia renovável. A eólica e a hídrica, entre outras, apesar de potencialmenmte úteis se enquadradas numa visão de desconcentração urbana (e não de mais concentração, como é usual) apresentam por vezes pesados impactos ambientais. Ora nós não estamos apenas numa emergência climática, estamos também, como afirmou um dos mais famosos cientistas portugueses, Miguel Bastos Araújo, agraciado com o Prémio Pessoa 2018, numa emergência ambiental.
Chave pouco conhecida: alteração do uso do solo
Por fim, há que referir um aspeto tão importante como o da redução de emissões: o da alteração do uso do solo. Do solo florestal autóctone ao solo agrícola, e deste ao solo urbanizado e impermeabilizado, há uma progressão exponencial na destruição dos fatores vegetais favoráveis à absorção do carbono lançado na atmosfera. Por essa razão, os município deveriam velar pela contenção da destruição dos solos, estancando e revertendo novas impermeabilizações de solos onde esteja ainda presente um coberto vegetal arbóreo, arbustivo ou herbáceo, incluindo campos agrícolas. E, por outro lado, incentivando, em escala cada vez mais ampla, a substituição de espécies arbóreas exóticas por espécies autóctones.
4 – Criar Cidades Regeneradoras
As grandes cidades julgam-se independentes da natureza mas isso não passa de uma ilusão, que vem quando muito desde a primeira metade do século XX.
Criou-se depois outra ilusão: a de que as cidades podiam ser sustentáveis, o que, assim dito, seria proclamá-las autossustentáveis, ocultando desse modo a sua realidade: elas são de facto «sustentadas» do exterior (contraditoriamente designado pelo termo alemão «hinterland» que significa… o interior). E, nesse processo de utilizarem intensamente recursos vindos de fora (fosse do campo circundante, fosse, cada vez mais, de longínquas paragens e do mundo todo), as cidades tornaram-se deglutidoras de todo o tipo de recursos, provocando a disrupção e mesmo a destruição de numerosos ecossistemas um pouco por todo o mundo.
Da sustentabilidade à regeneração
Com esses métodos de utilização dos recursos, as cidades não se limitam a destruir o que está no exterior delas – elas solapam o fundamento ecológico da sua própria existência. Com a generalização, nos anos 1990, da ideia de «desenvolvimento sustentável» começou a gerar-se a necessidade de tornar as cidades mais «sustentáveis» ou, talvez melhor, «menos insustentáveis». Herbert Girardet, já então um urbanista imbuído de cultura e ciência ecológica, condensou essa aspiração numa síntese brilhante na qual, em cerca de 80 páginas, traça novos rumos para as cidades sob o lema Criar Cidades Sustentáveis (Green Books, 1999 para a primeira edição inglesa; Edições Sempre-em-Pé, 2007, para a tradução portuguesa).
No entanto, Girardet deu-se bem conta que o mero «desenvolvimento sustentável» não era suficiente para a dimensão do problema. Não bastava às cidades usar os recursos de modo mais sustentável. Tinham que assumir a responsabilidade do seu uso dos recursos, fazendo disso um princípio organizativo, transformando a economia linear atual em que tudo acaba em lixo e desperdício numa economia circular de contínua reutilização, diminuindo fortemente a necessidade de matérias primas e alterando profundamente os impactos negativos que a economia desencadeia nos ecossistemas próximos e distantes.
Urbanização regeneradora
A urbanização regeneradora torna-se assim um imperativo. Este seu novo livro (Routledge, Oxon e Nova Iorque, 2015) contrasta o modelo da Agropolis, a cidade no enquadramento local da sua paisagem como o foi milenarmente até à chamada Revolução Industrial, com a Petropolis, a cidade atual dependente dos combustíveis fósseis. Através de uma original análise do «metabolismo urbano», Herbert Girardet chega ao conceito de Ecopolis, a cidade regeneradora ou simbiótica de que urgentemente precisamos com vista ao presente e ao futuro. O livro conclui com dois capítulos de «casos de estudo» de processos regeneradores já lançados ou em andamento: Adelaide (Austrália), Copenhaga e Kalundborg (Dinamarca), a região do Ruhr (Alemanha), Oakland (Estados Unidos), Accra (Ghana), Sevilha (Espanha) e outras.
Herbert Girardet apresenta no seu livro uma teoria urbana para o século XXI, uma redefinição da ecologia da cidade e uma ideia do seu papel regenerador para os ecossistemas naturais do mundo que será decerto fecunda e estimulante para todos os que se interessam pela conservação da natureza e pela qualidade de vida nas cidades.
Como uso diariamente scooter (é o meu transporte pessoal), vejo e sinto os efeitos dos escapes dos motores de combustão com mais intensidade.
Agora já estão quase tão incomodativos como antes da pandemia. Só se nota menos tráfego nas horas de lazer.
Sinto-o mais que os condutores de automóvel, já que as 2 rodas nos permitem contornar as filas, vamos em «espaço» aberto e quase só paramos no Stop.
É tremendo o número de automóveis sem controlo de gases poluentes (filtros removidos ou inexistentes), onde o fumo negro é uma constante. Não só porque o diesel impera como combustível, mas também porque as autoridades mantêm a permissividade na circulação de certos veículos.
Vai sendo tempo de exigir menos destruição ambiental e MENOS vítimas na saúde, com proibição do diesel em veículos ligeiros. Entendo que o cidadão só vai mudar se lhe custar mais caro poluir do que mudar de combustível. Por isso tem que ser crime usar diesel. E sim, há alternativas para que façam a mudança.
Sim, eu uso, eletrões.