Por J.Tenreiro
«A requalificação da Baixa vem reflectir uma questão que é abordada por muitos arquitectos, urbanistas e mesmo outros que dizem que em Portugal não há praças, pelo menos na concepção do que são as Praças Maiores espanholas, centro cívico, administrativo e comercial da cidade. Há até quem diga que o Terreiro do Paço, em Lisboa, não chega a ser uma praça porque lhe falta o quarto lado, o do Rio, e a mesma coisa acerca da Praça da Ribeira!! Assim o projecto para a requalificação da avenida surge como uma proposta “perfeita” para criar uma “Praça” no Porto. E sendo que na visão de muitos arquitectos de hoje uma praça não tem jardins, retiram-se os canteiros e faz-se um único empedrado desde o Palácio das Cardosas até à Câmara Municipal. Adoptam-se, modelos estrangeiros, à “falta” de portugueses, faz-se uma Piazza Navonna, importa-se de França o desenho de uma Fonte do Palácio do Luxemburgo para se colocar num topo, voltam-se as estátuas umas para as outras e já há “Praça”!
A proposta está mais de 90 anos atrasada! Veja-se a sua semelhança com o plano original de Barry Parker de 1915 (com uma fonte no mesmo local onde agora é proposta outra) que foi reformulado por Marques da Silva por se considerar já na época ultrapassado.
Já em 1954 Antão de Almeida Garrett alertava no Plano de Melhoramentos para a escassez de espaço verde na zona central da cidade nomeando a Avenida como um dos únicos espaços verdes na zona central da cidade a oriente da Rua do Almada.
Parece-me que vai suceder o mesmo que já ocorreu nos espaços requalificados, ou deverei dizer desqualificados, durante o Porto 2001. Mesmo a proposta para a Praça D. João I, que era das quatro aprovadas aquela que melhor compreendia a Baixa como espaço de estar, acabou infeliz. Lembro apenas que na proposta apresentada a concurso se propunha a reposição do pavimento central original, de calçada à portuguesa, com os signos do zodíaco rodeando uma rosa dos ventos. Propunha-se ainda o retorno de actividades comerciais aos locais da antiga garagem Fénix e outros que hoje estão completamente fechados à praça. As lojas não voltaram e a reposição do pavimento não foi feita, talvez até a pedido da própria Câmara, e a fonte saiu. Assim, com a perda do elemento central, a Praça D. João I tornou-se deserta e resume-se nos dias úteis à sua função de parque de estacionamento e só em certas ocasiões é um espaço com vida própria, como por exemplo no Euro 2004.
Na “Praça dos Leões” os canteiros foram reduzidos a dois pequenos tapetes quadrados junto às duas “novas” palmeiras. E se inicialmente estavam ajardinados ao gosto da restante intervenção, hoje são verdadeiras miniaturas dos antigos canteiros, resultando totalmente irónico o aspecto da praça.
Na Cordoaria proclamava-se um jardim mais transparente, para chamar as pessoas que daí tinham saído devido aos assaltos. Hoje está transparente mas deserto na mesma. Ninguém lá vai ou porque não aprecia o jardim na sua nova forma ou porque simplesmente não o consegue atravessar, dado os seus percursos labirínticos e unidireccionais. Relativamente à questão da desarborização o arquitecto paisagista que fez o projecto de intervenção disse apenas ter deitado abaixo as árvores que já tinham ultrapassado o seu prazo médio de vida!!!! Mesmo que não se aparentassem doentes foram deitadas abaixo simplesmente para passar um carreiro de granito que leva ao mesmo ponto que todos os demais do jardim. E tudo em nome da transparência!!…
Na época Siza manifestou-se contra este tipo de intervenção e na Rotunda da Boavista mostrou finalmente um melhor método de requalificação de um espaço público, não subvertendo o espírito original do jardim. Esperava-se o mesmo da Avenida dos Aliados, mas o que saiu foi isto……
Quanto à calçada devo dizer que os cubos de granito não parecem ser alternativa viável. Na Praça da Batalha pavimentou-se o solo com o mesmo granito que se está a pavimentar a avenida em nome dos antigos tempos em que tudo era assim. Só que nessa época, e isso não foi dito, não havia passeios! Os primeiros passeios periféricos foram em lageado de granito, e não em paralelo, e as primeiras placas centrais das praças apareceram sob a forma de calçada à portuguesa! Agora rua e passeio são iguais. A primeira foi até reduzida ao mínimo. A um mínimo tal que nem os carros lá cabem sendo obrigados a passar por cima do passeio!!! Com esta última requalificação poderemos ir de Massarelos até à Praça dos Poveiros sempre com o mesmo pavimento.
Anula-se, então, a calçada mais os seus motivos relativos ao vinho, homenagem à cidade, em nome do granito que, aliás, tende a ser mais irregular que a antiga calçada.
A calçada à portuguesa é tão lisboeta como portuense. Que faria um carioca se dissessem que o Calçadão do Rio é lisboeta?? E um macaense sobre a Praça do Leal Senado? Além disso a utilização do mesmo granito no espaço de circulação automóvel é também absolutamente absurda numa época em que todas as cidades com mais de 200.000 habitantes têm de fazer um mapa de ruídos! Será melhor o paralelo do que o alcatrão só pelo seu valor histórico??
Mantém-se o pavimento de calcário em redor da estátua de Almeida Garrett mas não se diz porquê. Na verdade esse pavimento foi desenhado por volta de 1954 pelo arquitecto Fernando Távora, patrono da Faculdade de Arquitectura, bem como professor e colega de Siza e Souto Moura.
A alteração da posição da estátua de D. Pedro, que não sei se irá para a frente, é o culminar de todas estas aberrações e revela total incompreensão do local em causa. A estátua encontrava-se no eixo dos tramos superiores da avenida, daí a sua forma em V. Com a sua alteração de posição toda a geometria da Avenida é posta em causa!
Por fim a remoção prevista das paragens de autocarro tornará este espaço completamente deserto. Funcionará simplesmente nas ocasiões referidas pelos próprios projectistas, ou seja, em manifestações populares e talvez quando um clube de futebol vencer o campeonato. Quereremos uma Avenida dos Aliados só para estas ocasiões ????
Siza disse que sabia que as pessoas iam discordar da intervenção. Mas então porque não reformulou a proposta? Estaremos condenados a viver numa cidade feita contra nós?? »
J. Tenreiro (enviado por mail)
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Ribeira és, Património Mundial eras!
Onde estão as pedras trabalhadas de História que foram Património Mundial antes da intervenção no Âmbito do “Porto Capital Europeia da Cultura” onde estão os corrimões de ferro forjado que começavam no inicio da descida para a Rua Cais da Ribeira e terminava com essa mesma descida junto as alminhas da ponte, agora esta lá uma homenagem ao serralheiro nacional, sem carteira profissional. Alargamento dos passeios sim, descaracterização não!
Esta não é a minha Ribeira, nem aquela que vemos nas fotografias antigas que uma ou outra pessoa guarda em sitio religioso em casa, esta é a ribeira do politico que vai fazendo de conta que faz estragando o património cultural e sentimental de todos nós, só para não fazer nada. Sr. Rui Rio fazer de conta que se faz da mais trabalho que fazer, descubra por si mesmo.
Queria chegar a uma certa idade e poder explicar aqueles que me rodearem o que a Ribeira foi antes de ter nascido, como a Ribeira foi enquanto eu cresci, quero que eles olhem para os calhaus, para os calhaus não. Para as pedras (para olhar para os calhaus tinham de ir a Avenida da Republica ver fotografias) que ainda restarem na Ribeira e que possam perceber onde se situava, o quê, e o que lá se fazia, e sobretudo sentir, sentir a ribeira como eu senti.
A mim tira-me o sono. A Vocês tira!
Da Ribeira até a Foz a Paisagem é sempre a mesma descaracterização e cinzento e dinheiro a entrar para os bolsos de alguém que tem uma pedreira de granito.